Analistas veem despreparo e falta de capacidade política após 3 meses de atuação da Câmara de Londrina


Os três primeiros meses da nova legislatura da Câmara Municipal de Londrina, no norte do Paraná, podem ser resumidos pelo “despreparo expressivo” dos vereadores e pela “falta de capacidade política de pautar o debate sobre a cidade”, segundo analistas políticos ouvidos pelo G1.

A Câmara de Vereadores da cidade conta com 19 parlamentares, sendo que nove ocupam a função pela primeira vez. Inicialmente, 10 novos vereadores ocupariam as vagas da casa, mas Fernando Madureira (PTB) e seu primeiro suplemente Douglas Pereira, assumiram cargos na gestão do prefeito Marcelo Belinati (PP). Com isso, Jamil Janene (PP) assumiu uma vaga, em seu quarto mandato legislativo. 

O analista político Fábio Silveira não vê, na atual legislatura, uma postura fiscalizatória e de criação de debates para a cidade, mas uma Câmara que se envolve mais em polêmicas, como o caso da moção de apoio a um estagiário demitido após postagens machistas em uma rede social. “Eu mediria a atuação da Câmara por esta dificuldade política, essa falta de capacidade política de pautar o debate sobre a cidade”, afirmou.

Para Silveira, o Poder Executivo é quem costuma pautar a Câmara, com projetos mais relevantes para a sociedade. “O executivo ainda não propôs nada polêmico, tem algumas coisas que estamos esperando para esse ano, como a correção da planta de valores”, explicou.

Segundo o analista, ainda não é possível identificar as bancadas de situação e de oposição na Câmara de Londrina, justamente porque ainda não houve nenhum debate relevante na casa.

“A pauta está super fraca. A impressão é que o Marcelo [Belinati, prefeito] está estruturando pautas e ideias para entrar em campo”, pontuou.

Já de acordo com o analista político Elve Cenci, os projetos apresentados até agora na Câmara de Vereadores não mexem com nenhuma questão central para a cidade. “O que se vê são muitas ações isoladas e ações desencontradas”, disse.

 Cenci acredita que, em alguns casos, há desconhecimento da função legislativa, mas, para ele, na maioria dos casos há claro interesse de criar um fato político.

“Os novatos, sobretudo, talvez estejam se acostumando com a casa. Ou seja, é o momento de tentar entender a dinâmica do parlamento. Tivemos uma renovação expressiva e a saída de vereadores importantes”, declarou.

O analista pondera que os novos vereadores precisam mostrar a que vieram e que, apesar do pouco tempo, nenhum ainda mostrou uma atuação que marcasse uma posição.

“Eu acho, comparativamente com o anterior, que a Câmara perdeu quadros importantes. Não dá pra configurar ainda uma identidade dessa nova câmara, mas algumas atitudes dos vereadores demonstram um despreparo muito expressivo”, comentou Cenci.

 

Polêmicas no legislativo

 

Os três primeiros meses de trabalho do Legislativo Municipal foram marcados por algumas polêmicas que não passaram despercebidas pelos moradores.

Depois de fiscalizar a Unidade Pronto-Atendimento 24 horas do Jardim do Sol, o vereador Emerson Petriv (PR), conhecido como Boca Aberta, virou réu em um processo disciplinar da Comissão de Ética. Os membros apuram denúncia sobre possível conduta inadequada do vereador. Os fatos ocorreram em janeiro, e a decisão final sobre o assunto ainda não tem previsão de ser votada.

A Câmara também polemizou ao aprovar uma moção de apoio, proposta pelo vereador Filipe Barros (PRB), a um estagiário de Maringá que foi criticado após publicar frases machistas em uma rede social. Na época, a única representante mulher no Legislativo, Daniele Ziober (PPS), foi favorável à moção de apoio. Logo depois, a vereadora disse ao G1 que acabou votando a favor do texto porque não sabia sobre o que se tratava, não tinha conhecimento.

A escolha dos membros que compõe as comissões da Casa também causou discussões e não passou em branco. Para presidir a Comissão de Ética, uma das mais importantes da Casa, os parlamentares escolheram o vereador Gérson Araújo (PSDB), que é réu em um processo por improbidade administrativa. Ele é suspeito de ter favorecido a construtora Iguaçu do Brasil no período que atuou como prefeito interino de Londrina. O vereador nega as acusações.

Além desses pontos, um projeto de lei de 2013 para instituir o Dia do Nascituro, de autoria de Péricles Deliberador (PSC) e do ex-vereador Tio Douglas (PTB), também gerou muita discussão. Em uma audiência pública para debater a possibilidade de instituir o dia no calendário oficial do município, o plenário da Câmara ficou lotado e 60 pessoas se inscreveram para falar durante o debate. A audiência que era para definir a inclusão ou não da data, foi pautada pela defesa de ideais religiosos e dos direitos das mulheres.

E para tentar dar um desfecho final entre as discussões entre motoristas de Táxi e do aplicativo Uber, um projeto de lei foi protocolado pelo vereador Professor Rony (PTB), em fevereiro, para regulamentar o uso de aplicativos, como o Uber, para o transporte individual de passageiros.

 

A atuação dos vereadores

 

O vereador tem como função elaborar leis municipais e fiscalizar a atuação do Executivo, ou seja, do prefeito. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o vereador faz o papel de ligação entre o governo e o povo.

Para acompanhar o trabalho dos vereadores, os eleitores podem ir às sessões legislativas ou procurar pelos parlamentares em seus gabinetes.

Em Londrina, as sessões ordinárias são realizadas as terças e quintas-feiras, às 14h. As segundas, quartas e sextas-feiras são realizadas as reuniões públicas das 12 comissões permanentes. Todos os vereadores têm que participar dessas comissões. A Comissão de Ética Parlamentar analisa, atualmente, denúncias contra o vereador Boca Aberta (PR).

No período da noite, sempre as segundas e quartas-feiras, também são agendadas audiências públicas.

Além disso, duas comissões especiais estão em andamento: a Comissão especial de Desburocratização e a Comissão especial de avaliação da situação financeira e contábil da Sercomtel Iluminação.

Projetos, requerimentos e pedidos de informação

 

Os vereadores podem apresentar quatro tipos de projetos: Projeto de Lei, Projeto de Decreto Legislativo, Projeto de Resolução e Projeto de Emenda à Lei Orgânica.

Ainda como forma de atuação, os parlamentares podem enviar pedidos de informação a diversos órgãos. Em 2017 já foram 72 pedidos, sendo a maioria direcionada ao prefeito de Londrina: 69 solicitações.

Também já foram enviados 102 requerimentos pelos vereadores. Entre os requerimentos há convites, congratulações, moções de apoio e pedidos para realização de audiências públicas.

Levantamento feito pelo G1, entre janeiro e março, mostra que os vereadores apresentaram 63 propostas de projetos, sendo a maioria de Projetos de Lei (59). Do total de projetos protocolados, 57 são de autoria individual, ou seja, de um único vereador ou do Poder Executivo. Os outros seis projetos são de autoria conjunta, reunindo a assinatura de vários parlamentares.

O analista Elve Cenci afirma que a maioria dos projetos desta legislatura, avaliados por ele, eram projetos que apresentavam um olhar limitado e que não afetavam questões estruturais. Ele cita o exemplo de um projeto do vereador Amauri Cardoso (PSDB) que prevê a criação de um recanto de convivência animal, chamado ParCão.

“Tem uma questão estrutural que, na minha avaliação, é a mais importante, que é aquela discussão sobre a questão das zoonoses, de se criar um centro de zoonoses. Tanto o Executivo quanto o Legislativo poderiam pensar isso em conjunto, com a sociedade civil e com as universidades”, afirma.

No centro de polêmicas, o vereador com maior número de projetos é Boca Aberta (PR), com 12 propostas. No entanto, apenas duas continuam tramitando e foram encaminhadas para manifestação de órgãos ou entidades competente. Das outras dez, cinco tiveram tramitação interrompida por tempo indeterminado, três tiveram parecer contrário da Comissão de Justiça, Legislação e Redação, e duas foram arquivadas.

Fábio Silveira considera um acerto do vereador a fiscalização da saúde. “O problema é o método, ele usou um método equivocado para fazer uma coisa que é interessante para todo mundo. Agora, eu não vejo outros vereadores, nem com e nem sem equívocos, tentando criar esse tipo de debate”, explicou.

Para Cenci, o vereador Boca Aberta faz pirotecnia para causar impacto social junto a seus eleitores. “São projetos que têm custo e tem que se discutir, por exemplo, a questão do vício de origem, se é competência do Legislativo, ou se é um projeto que tem vício de origem e tem que passar pelo Executivo. Então, ele propõe e depois vê o que dá. Ou seja, claramente com o objetivo de provocar um efeito político. Enfim, é uma ação política muito mais, em alguns casos, que um ato legislativo”, acredita.

Ao G1, o vereador Boca Aberta (PR) confirmou que vários projetos apresentados por ele tiveram parecer contrário da Comissão de Justiça, mas disse que vai rebater os pareceres da casa e tentar levar a discussão adiante.

Ele citou o projeto que exige que médicos e enfermeiros e Unidades de Pronto Atendimento batam ponto eletrônico a cada 30 minutos, para comprovar o cumprimento da carga horário do plantão, além de proibir o uso de smartphones em horário de trabalho.

Outro projeto rejeitado prevê a devolução de R$ 13 milhões que estão há mais de um ano em um fundo da Câmara de Vereadores. Segundo ele, os assessores jurídicos já estão preparando um recurso.

“Todos os nossos projetos são competência do legislativo”, afirma. O vereador reclama que há uma certa resistência ao seu nome do legislativo, o que faz com que seus projetos sejam rejeitados antes da discussão.

“Quando se trata do Boca Aberta, alguns vereadores remanescentes já ficam com o pé atrás”, relata.

Do total de projetos apresentados em 2017, apenas um, de autoria do Executivo já foi sancionado. A lei suspende a contribuição de 4% dos órgãos da administração direta e indireta, calculados sobre o total da folha de pagamento ao plano de Assistência à Saúde da Caixa de Assistência e Pensões dos Servidores Municipais de Londrina (CAPSML), até dezembro deste ano.

O Executivo justificou que, segundo projeção da Secretaria da Fazenda, o município ficará com déficit de R$ 120 milhões neste ano. “Obter o equilíbrio fiscal nas finanças municipais é obrigação legal e prioridade absoluta da atual administração”, diz o texto da proposta.

Segundo o projeto, a CAPSML tem R$ 57 milhões de reserva técnica, valor superior aos R$ 20 milhões necessários.

Dos 19 vereadores da cidade, seis não apresentaram nenhum projeto entre janeiro e março: Jamil Janene (PP), Vilson Bittencourt (PSB), Felipe Prochet (PSD), o presidente da Câmara Mario Takahashi (PV), Eduardo Tominaga (DEM) e João Martins (PSL).

Silveira afirma que não dá para dizer que os vereadores não estão trabalhando pelo fato de não apresentarem projetos, mas acha significativo que um terço da Câmara ainda não tenha apresentado projetos.

Segundo ele, os parlamentares usam as leis para levantar bandeiras, chamar a atenção da população por causa disso. “É curioso, mas não quer dizer que estão atuando mal”, ressalta.

Cenci acredita que Londrina tem uma espécie de inflação legislativa, pois há um excesso de leis. “Nós precisamos, hoje, muito mais de qualidade nos projetos, e diálogo, sintonia com a comunidade e consistência nesses projetos do que uma quantidade de projetos”, afirmou o analista.

 

O que dizem os vereadores que não apresentaram projetos

 

O vereador Jamil Janene (PP) afirma que nestes 100 dias de trabalho tem participado semanalmente de reuniões de três comissões legislativas, das quais faz parte, e por isso tem trabalhado nos projetos que são analisados por elas. "Não tem como apresentar projeto que não tenha interesse público. Vereador não foi eleito apenas para criar leis que nunca sairão do papel, o vereador precisa pensar nas necessidades da população e criar projetos que beneficiem os moradores", disse.

O vereador, que já está em seu quarto mandato legislativo, afirma que nesse período já teve 93 leis aprovadas, 1.296 requerimentos coletivos e 182 requerimentos individuais aprovados. "O papel do vereador não é só fazer lei, é fiscalizar e legislar", finalizou.

O vereador Vilson Bittencourt (PSB) disse que há projetos de sua autoria, da legislatura anterior, que ainda estão tramitando na casa. De acordo com ele, outras ideias estão sendo avaliadas, inclusive com a verificação da aplicação em outros municípios. “Alguns projetos estão sendo amadurecidos”, declarou ao G1.

O vereador Felipe Prochet (PSD) reconheceu que não apresentou nenhum projeto de lei individual no período, mas disse que quatro projetos estão em fase final de elaboração e um ainda está em estudo. "Quatro já estão quase prontos e devo apresentá-los nas próximas semanas. O outro ainda estamos analisando, estudando possibilidades, verificando se há algo parecido em outras cidades", diz o vereador. O parlamentar informou que os projetos vão atender as áreas de educação, esporte e trânsito.

O vereador Mario Takahashi (PV), presidente da Câmara Municipal de Londrina está em viagem oficial ao Japão. A assessoria do parlamentar informou que o advogado foi eleito para o seu segundo mandato na Câmara de Londrina tem como um dos principais desafios melhorar e atualizar a estrutura da Câmara para atender a população com eficiência.

"É o que tem sido feito por meio de um Plano Estratégico apresentado no início deste ano. O plano prevê o fortalecimento do Legislativo como Poder independente, por meio de mecanismos eficientes de fiscalização, tecnologia e gestão; reforma estrutural e administrativa e implantação de sistemas eletrônicos de informação e transparência", diz a nota

Ainda de acordo com a assessoria do vereador Mario Takahashi, a apresentação dos projetos de lei são importantes, mas representam apenas uma parcela das inúmeras atribuições dos parlamentares londrinenses. O número de leis no Município supera os 12.400 diplomas legais, além de centenas de decretos e portarias, que precisam ser urgentemente revisados e fiscalizados.

O vereador Eduardo Tominaga diz que não vê a criação de projetos de lei como uma prioridade. Para ele, o mais importante agora é revisar as mais de 12 mil leis municipais que foram criadas. " Estou voltado na revisão de leisp para desburocratizar o desenvolvimento econômico do município. Vejo que agora é mais importante readequar leis existentes, do que criar novas que não farão nenhuma diferença para a população" , disse.

O parlamentar ainda criticou a criação de projetos de lei inconstitucionais ou que não ajudarão no desenvolvimento da cidade. "Não adianta criar leis que não vão ajudar a população", concluiu.

G1 entrou em contato com o vereador João Martins (PSL) e aguarda retorno.

Fonte: http://g1.globo.com/pr